segunda-feira, 26 de maio de 2014

Nosso amor, nossas mãos.


Confie na intuição, na sabedoria
e no Amor que habita em você.
Mas aquele Amor, este Amor, o Amor que será,
o que são, senão o mesmo,
não será o mesmo Amor?

Aprendi que o Amor não deve ser somente
como um sentimento falado,
ou expresso em versos,
ou poemas, declamados ou escritos,
aparentemente belos,
retoricamente disciplinados.

Mas em tudo, o Amor deve ser,
além do espaço e do tempo,
alma de nossos gestos,
o espírito e a força motriz
dos nossos mais modestos
sensatos movimentos.
É aquilo de bom, materializado sempre
em nossas expressões,
principalmente, nas mais simples,
singelas, aquelas
que transparecem e percebidas são
através do olhar,
de toda intenção,
intervenção ou ação:
essências vitais, nutrientes,
sementes, adubos e frutos
de ternura, respeito e gratidão.

Caminho aprendendo,
aprendendo conquisto
o entendimento
o qual anuncia
que o propósito implícito no ato de amar,
para poder percebê-lo,
é sempre uma expansão
da percepção.

Este é o meu testemunho.
Quem tem o verdadeiro Amor
o tem para sempre;
tem a vida,
dentro de si,
divinamente expandida,
compartilhada,
eternamente viva.
Não há retrocesso
nem deterioração.

Não importa o momento,
nem a condição.
Com Amor, sempre,
me dê a sua,
te dou a minha,
as nossas mãos.

Afinal, para que serve 
o Amor?



quinta-feira, 22 de maio de 2014

A Couraça Escusada


Enquanto houver a couraça
não haverá nada além
das aparências e do olhar.
Só o confronto dominará
toda a poesia que há
em cada um dos lados.

O olhar, a única porta
de onde se vê aquilo que
já se conhece: apenas uma ou duas pétalas da flor.
O restante é completo segredo.
Autosegredo de um jardim vivo e intocável.
Mas sabe-se que há a habitar, pelo menos,
uma adorável tulipa,
um majestoso jasmim.

Fora, sem a verdadeira flor,
insiste-se na caminhada
pela estrada mais obscura.
Quem sabe só exista esta
naquela concepção.
Naquele, que parece outro,
secreto coração.
Quem sabe, naquela,
ela não seja o que transparece ser.

Não nos cabe julgar,
nem assumir,
de outros,
escolhas, atitudes,
temores, tristezas,
nem aparentes incoerências.

Pois é a pessoa,
exclusivamente ela,
responsável
por aquilo que ela
fez, e faz,
com o que  fizeram a ela.

Coloca naquelas mãos
seus erros, suas virtudes,
seu sincero arrependimento,
seu amor verdadeiro.
E ela decidirá o que fazer com isso.

É assim que tudo parece ser,
e talvez seja,
no íntimo, na unicidade,
no coração
de cada relação.

Por isso, não sofra tanto.
Saia para ver o Sol
que, a cada dia, ressurge.
Já não é o mesmo Sol,
já não é o mesmo dia.
Por isso, traz sempre novidades.
E que sejam as boas, a maioria.

Sempre vá ao encontro
se existir um sorriso,
um humor genuíno,
amoroso, benevolente,
que lhe traga um olhar
sorridente
e, sinceramente,
uma alma de bem com a vida,
com o passado, o futuro
e, principalmente,
com o presente.

Sem a couraça,
tudo se faz possível.
Nascer, de um aperto amoroso das mãos,
um autentico milagre:
perfeito, imediato,
inquestionável,
efetivo, testemunhado,
sem sequelas,
nem ressentimentos,
para se festejar,
pelo restante
deste romance,
deste instante,
desta vida.

Desarme-se. Pois não há o que temer.
Você só será amada. Como nunca. Mais que nunca,
querida, protegida, amada além de qualquer limite.
Não há como ser diferente. Essa é a nossa aprendizagem,
a nossa sabedoria, o nosso destino,
a nossa comunhão, o nosso milagre.


domingo, 18 de maio de 2014

Pousadas Abandonadas


Ao caminhar pela extensão de uma praia,
imensa e deslumbrante, me deparei com o próprio tempo
materializado na imponência de lares omitidos,
de abrigos antigos, consolidados, repletos de uma beleza esquecida,
entorpecidos, abandonados.

Abandono. Esquecimento. Saudade. Retorno.
Restauração: é preciso reencontrar a beleza, de fato, obscurecida, 
jamais perdida, jamais esquecida, contraponto de uma rejeição.
Por isso, um inesquecível elemento da mémoria,
desde a partida,
quase perdida.
Fugidio conto deste livro de histórias.

Dentre todas, 
a mais forte razão
entre duas vidas, 
alma a alma,
a derradeira intenção.

Uma coragem pra tudo,
desmedida,
um amor infinito 
acasalador
de toda uma trilha,
um impulso cósmico,
um reconhecido universo.

Um teto, uma casa, um lar,
uma pousada para todo o passado 
que não se deve e não se quer,
definitivamente, apagar. 

Pois nunca houve
absoluta e resoluta razão 
para  tão pungente deserção, descomunal abdicação,
riscoso desabrigo, tremido repúdio,
audaciosa e lancinante,
insensata desproteção.  
Ou quase não. Se não fosse 
por uma necessária e imprescíndivel,
revigorante e indispensável,
distinta reformulação.

Venturosa aprendizagem.
Mais sagrada, mais nobre, mais forte 
que a destrutiva entropia. Flexa do tempo.
Quase reversibilidade. Resgate de tudo aquilo que é bom, 
uma nova pintura, uma cor de esmeralda, uma restauração.

Residir, vestir, viver.
Resta saber, quem a habitará
com o corpo e a alma,
reassumí-la, redecorá-la, renová-la com
flores, epístolas e mobílias restauradas
cujas pétalas, linhas e teclas 
ainda não foram
devidamente
tocadas.
Mais uma utopia para este tão factual e reiterado dia?



quinta-feira, 15 de maio de 2014

Talvez ele não esteja exatamente por aqui


                                 
11/5/2014, próximo ao rio Embassaí, BA.

Na noite passada, minhas últimas tarefas
foram olhar ao telescópio e arrumar as malas.
Chego em Salvador; Tempo fechado.
Penso: chuva prometida que já estava ali,
mas que se entregará
aos meus caprichos de motorista paulista,
que aluga um carro econômico
para desafiar a Estrada do Coco
tentando chegar, são e salvo,
na pousada escondida,
entre o rio e o mar,
Luar da Praia, em Embassaí.

E que falta de Luar, estaria a me esperar,
nesta viagem sonhada até a
Costa do Sauipe...
...onde, desta vez, pobres físicos,
não jogadores de tênis milionários,
resolveram se enfrentar
para um torneio de conhecimento
sobre a matéria condensada.
Por isso, algum inverso desconforto,
e inesperada reclamação 
de exagerado luxo e de pronunciada ostentação.
Mas isso não foi, nem de longe,
o vintage spirit desta pequena aventura.

E qual não foi (e ainda é) a minha surpresa
- contextual e semiótica-
de, logo ao chegar ao Luar,
encarar um poema,
até então, para mim desconhecido,
escrito por Rosália de Castro,
poetisa galega, em 1884:
mesmo ano do naufrágio, nos mares dos Açores,
da embarcação "União",
algures entre as ilhas 
de São Miguel e São João,
fato que teria inspirado o tal poema 
pela perda de um,
jamais superado, 
tão intenso amor de Espanha.
Ano, também em que nasceu
Amedeo Modigliani.
Pintor e escultor maior 
da arte moderna italiana,
excelso investigador das expressões humanas
diante de perdas, dúvidas, angustias;
pesadas, profundas, vitalícias.

Então, em frente à mesa,
onde descanso o meu notebook
para recuperar o vaucher que,
por negligencia, não imprimi,
repousa, por alguma razão,
o pergaminho envelhecido:

Hable con mi mismo, lo siento.
Alma que vas huyendo de ti misma,

¿qué buscas, insensata, en las demás?

Si secó en ti la fuente del consuelo,

secas todas las fuentes has de hallar.

¡Que hay en el cielo estrellas todavía,

y hay en la tierra flores perfumadas!

¡Sí...! Mas no son ya aquellas

que tú amaste y te amaron, lo siento.

Sed de amores tenía, y dejaste
que la apagase en tu boca,
y te encontraste sin honra,
ignorando que hay labios que secan
y que manchan cuanto tocan.

Pero yo sé también,
mi reina, porque a veces
hay compasiones traidoras,
que si el sediento volviese
a implorar misericordia,
su sed de nuevo apagaras,
samaritana piadosa.

Volverá, te lo juro;
desde que una fuente enlodan
con su pico esas aves de paso,
se van a beber a otra.

Leio e releio. Imagino. Contemplo. Assimilo.
Arranco cada palavra pela raiz.
E, então, me vou. Envolto por este vínculo
insubordinado que há de nos acompanhar
eternamente através das palavras: poemas;
teoremas demonstrados pela
linguagem da alma.

Desfaço minhas malas pensando.
Ainda pensando em sed de amores tenía.
Respirando o aroma de cada palavra
que como flores são no jardim da alma.
Entorpecente sensação que só a arte mais crua
é capaz de estimular em mim.

Me banho ainda embutido
nesta sensação,
que me coloca absorto,
após o banho, deitado na rede,
ouvindo a chuva
a cair sobre o mar
que parece não se importar
com a minha, inerte e contemplativa,
entorpecida presença.

A noite de céu escuro,
com baixas e gigantescas 
nuvens de chuva, a ocultar a lua,
me convida a contemplar um mar noturno, 
imenso, cinzento, sonoro, quase revolto,
onde nas profundezas, daqui onde o admiro,
tudo parece profundamente distante, alheio e assustador.
Estou, portanto, lúcido 
da sua profundidade e da sua extensão.
De certa forma, da sua beleza e assustadora imensidão. 


Me pergunto: o que acontece lá embaixo logo agora?
O que fazem, e porque fazem,
os seres que lá habitam neste exato momento?
Ao confrontar esta dúvida com outras ainda mais imensas;
como as imensidões onde habitam outras pessoas,
outros países, outros planetas, outras estrelas;
e a própria imensidão do tempo;
minha sensação imediata é aquela de forasteiro.

Me parece, pela média das nossas expressões,
que estamos, mesmo, só de passagem.
Que viemos, de alguma forma, para observar,
apenas, um ínfimo.
Experimentar algo que, de fato, não nos pertence,
que não conhecemos, que não nos é familiar.

Viemos para, espantados,
admirar, indagar, pensar, temer,
sentir falta de algo que nunca teremos aqui.
Concluir que, de fato, estamos quase sempre com sede,
com fome, com frio.
Estamos quase sempre, com ou sem brilho,
distantes de nós mesmos. Fora do equilíbrio.

Pertencemos, de fato, a um outro mundo.
E a sensação de pertencer é ainda enigmática.
A percepção de pertencer, de estar aqui,
existir assim, consciente das horas,
das estações, dos crepúsculos, das auroras,
passadas, agora, e que, ainda, estão por vir.
Consciência de si neste mundo.

Como temos a consciência,
que também revela a possibilidade de um espírito,
de um espectro, um lastro, uma dimensão extra,
eternamente inexplicável,
tenho a sensação que só pode ser isso:
Não pertencemos a este mundo.

Não sabemos quando e porque chegamos
e nem tampouco quando daqui partiremos,
regressando, talvez, para o nosso verdadeiro mundo.
Mesmo que seja parecido com a ausência
de quase tudo que está aqui.

Universo, portanto, ainda,
(aparentemente?)
quase desconhecido.
Quase descabido. Um sonho sem igual:
uma verdade alcançável, supero consciente.
Diante desta, uma outra
muito menor em extensão,
por isso, absolutamente, presente e atingível.
Infinitamente tangível, acolhedora e familiar.
Para percebê-la,
cerrar todos os olhos bastaria: do corpo e da alma.
Mas a quem é dada esta dádiva?

Dádivas são divinas como este suposto outro mundo.
Um mundo íntimo onde tudo se conhece,
onde a sensação de proteção é como se fosse
eternamente eterna, ternamente disponível.
Não importando quem se é, aqui, nesta passagem.
No veio da viagem, a primeira, a mais pura
e autentica imagem.
O olhar é o bastante, o único bilhete,
a única identidade.

Por isso, um mundo onde se é.
Onde se sente
sempre presente,
acolhido como fruto germinado,
filho amado,
sem exaustão.

Onde se respira ternura
e sempre se sente envolvido,
por um abraço quentinho,
aconchegante, de cheiro antigo e familiar,
quando bate a brisa fria.

Sem monotonia,
o ninho maior,
a forma mais pura,
mais desejável,
da inquestionável
e delicada
fecundidade,
da fecunda
felicidade.

Esse parece ser o verdadeiro universo onde nos forjamos,
onde nos sentimos plenamente satisfeitos.
Eternamente felizes, destituídos de qualquer ansiedade,
dúvida, medo, sofrimento, julgamento ou culpa.
Um mundo onde sempre sabemos
porque lá estamos e para que existimos.
E não nos esgotamos disso.

Um mundo além do humano.
Um mundo que não precisa ser explicado;
Onde, por isso, não há conflitos,
aflições e aflitos,
nem barganhas,
nem ganhos e perdas,
nem, pequenos ou grandes,
delitos e desafios.

Nada muito além do eterno
e adocicado prazer.
Valor advindo
do mais genuíno,
denso e sereno,
néctar da paz sem fim.

Arrisco afirmar: a paz e o amor supremos
são a essência deste nosso íntimo,
único e verdadeiro mundo.
Como o habitamos?
Em que estrutura de espaço e de tempo?
Regidos por qual natureza?
Talvez, a face completa deste conhecimento
só nos será revelada quando lá estivermos.
Por completo.

Lá, desconfio, somos todos sábios.
Sábias crianças, pequenos deuses
infinitamente carentes do maior substrato
que só lá existe
de forma explícita e abundante;
sabiamente, um paradoxo: o infinito amor.
Um nada, de tudo que não é amor.

Então, lá, é onde
só há o amor a esperar, só há o amor a oferecer.
Um universo íntimo
de infinita carência e infinita presença
do mais puro amor: o perfeito equilíbrio,
precisa harmonia e confiança
do maior (e menor ) dos equilibristas.

É isso, lá somos perfeitos equilibristas,
na dose certa, meio a meio,
carentes e devoradores de amor.
Amor sem fim.
Então, concluo, não,
não é aqui.

Mas, afinal, qual é o mistério,
misterioso objetivo
e misteriosa sabedoria, 
de estarmos aqui, agora, como forasteiros
neste quase imenso vazio
repleto de quase infinitas distâncias,
obscuro frio,
entre bilhões e bilhões de estrelas,
bilhões de outras pessoas,
seres quase sempre desconhecidos, distantes, desamparados?
Mutilados por certezas incertas
fragmentadas, estampadas em outdoors
e outras vitrines.

Como uma lucidez inebriante
nos eleva e nos leva a concluir:
estamos aqui de passagem,
quase desequilibrados, carentes de paz,
quase sempre a indagar.

Forasteiros, aventureiros passageiros,
a procura de poucas e precisas respostas
para infinitas e mal formuladas perguntas.

Onde está a nossa verdade?
Onde se esconde o nosso verdadeiro universo?
Onde mora o nosso verdadeiro amor?